segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Reminiscências e futuro

Hoje é dia de lembranças. Não das ruins, mas daquelas que, ao longo da vida, nos ajudam a ser quem somos, a acreditar, a seguir em frente. E quantas vezes não temos consciência do efeito de nossa presença/ausência na vida de outrem.

Minha vida foi marcada pela leitura. Só muitos e muitos anos depois tomei gosto pela escrita. E foram muitos anos mais tarde mesmo. Aqui dentro de mim lembranças há, porém, de homens e mulheres das artes que me ajudaram a ser essa pessoa que me tornei. Boa ou ruim, sou o melhor que consegui ser.

O primeiro deles foi Machado de Assis. Dom Casmurro foi lido em um único dia. Tínhamos acabado de mudar para a casa onde vivo até hoje e, na época, a rede na varanda era um convite à delícia de me tornar inerte no corpo e deixar o pensamento vagar e voar alto nas palavras deste magnífico autor. Meu ego adolescente me dizia que Machado escrevia para mim. Não fosse assim, como poderia usar aquela linguagem e me indagar na hora exata e no momento preciso? Conhecia, eu sei.

Depois, outro encanto, conheci Rubem Braga. Amor pelo escritor. Queria tê-lo conhecido e o luto sentido quando soube de sua passagem machucou meu coração como se um parente querido tivesse ido embora sem que eu tivesse tido a chance de abraçá-lo e dizer que todos merecem ter uma borboleta amarela em suas vidas e que as palavras em "A Viajante" me ajudaram a superar perdas durante minha vida. Afinal, quando ele escreveu as linhas abaixo estava, de fato, assinando um termo de libertação para aqueles que, talvez por nosso egoísmo, queremos que fiquem perto.

"Em minhas andanças, eu quase nunca soube se estava fugindo de alguma coisa ou caçando outra. Você talvez esteja fugindo de si mesma, e a si mesma caçando; nesta brincadeira boba passamos todos, os inquietos, a maior parte da vida — e às vezes reparamos que é ela que se vai, está sempre indo, e nós (às vezes) estamos apenas quietos, vazios, parados, ficando. Assim estou eu. E não é sem melancolia que me preparo para ver você sumir na curva do rio — você que não chegou a entrar na minha vida, que não pisou na minha barranca, mas, por um instante, deu um movimento mais alegre à corrente, mais brilho às espumas e mais doçura ao murmúrio das águas. Foi um belo momento, que resultou triste, mas passou."

Lembrei desse texto no fim de semana, no momento em que ouvi de alguém por quem aprendi a ter muito apreço um "eu sou livre" que me feriu a alma naquele instante. Depois passou. Livres somos todos nós. Eu também sou. Livre é cada um que nasce. Só não é livre quem não opta por viver plena e integralmente. Somos, ambos, almas livres. Contraditoriamente, porém, gostamos de olhares, de carinhos, de aconchegos.

Mas, dura vida essa nossa, assumimos responsabilidades. Nos tornamos pessoas "importantes", responsáveis, ocupadas, temos grandes projetos, representamos mega instituições e precisamos nos abster de quaisquer sentimentos e relacionamentos que possam, mesmo de longe, afetar nossa LIBERDADE. Porque precisamos e queremos ser livres...

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Sabe de uma coisa? Eu trocaria essa liberdade pelo sorriso que você estampa quando eu chego. Trocaria essa liberdade pelo cheiro, pelo calor, pelo abraço, pelo cabelo caindo no rosto. Até pelo "vamos dançar?" e a fuga de tudo e todos no meio da noite, para ficarmos sós. Nós e nossa liberdade.

Mas lembro do velho Braga. Quem sabe essa nossa vontade de sermos livres não seja uma fuga de nós mesmos? Ainda com o meu autor predileto, massageio o coração e penso que gostar de alguém é saber o momento de parar. Embora eu não queira. Embora eu queria mais sorrisos e mais cheiro e mais calor e mais aconchego e mais cabelo caindo no rosto e mais fuga de tudo e todos. E aí vem o tal gostar de fato. Você, assim como Braga disse, que não chegou a entrar na minha vida, mas, acredite, fez uma bagunça aqui dentro do meu peito. Não que eu quisesse, saiba disso. Eu tinha uma vidinha livre e organizada aqui no meu caos particular. Apaixonar e ficar encantada não estava no programa. E aí vem o Braga de novo... "Foi um belo momento, que resultou triste, mas passou."

Então lembro de Marina, cantando Cazuza com maestria e me traduzindo (outra vez meu ego): "eu quero a sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida". Mas essa tal fruta não podemos ter... porque somos livres.

A você, que chegou de mansinho, a quem percebi no meio de tantos outros rostos, que me fez redescobrir sentimentos letárgicos há tantos anos, que me fez lembrar como é ter as pernas trêmulas e a cara de boba ao ficar frente a frente, só posso dizer que entendo sua liberdade e saio de cena, não sem antes confessar minha imensa vontade de participar de tantos e tantos atos mais com você nesse imenso teatro que é a vida.

E Serginho Queiroz canta no Media Player: "Mas o que somos nós? Gente só, gente só..." Nós e nossa liberdade. Voe. Viva. Seja livre. Abraços fraternos eu quero, sim, e vou me contentar com eles. Porque somos livres. Como deve ser...

3 comentários:

Anônimo disse...

Wellcome back!!!Isso é que é "conteúdo". Quando voce faz ou registra alguma coisa, é pra arrebentar.Emocionante!!

Anônimo disse...

como vai vc ? bjao

Anônimo disse...

opa!Anônima... Alessandra Contiero